Pergunta: Quais são os medicamentos que poderiam interagir com a maconha?

Nos Estados Unidos, 26 estados e o Distrito de Colúmbia têm atualmente leis que, de algum modo, legalizam a maconha. Mas, independentemente do status legal, o uso recreativo e medicinal da maconha é comum em todo os Estados Unidos. Com o aumento da disponibilidade, e também com a crescente potência da maconha, é importante que usuários e profissionais de saúde estejam cientes das potenciais interações farmacológicas associadas à utilização deste produto.
O tetraidrocanabinol (THC) é o principal canabinoide psicoativo encontrado na maconha. O canabidiol (CBD) também é encontrado em altas concentrações na maconha, mas não é psicoativo; tem efeito antagonista nos receptores canabinoides e parece bloquear alguns dos efeitos do tetraidrocanabinol. O canabinol (CBN) é um canabinoide psicoativo relativamente fraco existente em quantidades muito pequenas na planta da maconha, mas é um dos principais metabólitos do tetraidrocanabinol.
A planta de maconha contém mais de 50 outros canabinoides, porém os medicamentos sintéticos aprovados pela US Food and Drug Administration (por exemplo, o dronabinol e a nabilona) contêm apenas tetraidrocanabinol sem canabidiol. O efeito farmacológico desses produtos pode ser diferente do efeito natural da Cannabis.
Os dados sobre as potenciais interações farmacológicas associadas ao uso da maconha são limitados. No entanto, interações não estudadas podem ser teorizadas com base no metabolismo dos canabinoides primários da maconha.
Enzimas do citocromo P450
As enzimas do citocromo P450 (CYP450, do inglês CY tochrome P ) são responsáveis pelo metabolismo da maioria dos produtos químicos e dos medicamentos que entram no corpo humano.
Os humanos têm aproximadamente 60 genes codificando o citocromo P. As enzimas do CYP450 encontram-se principalmente nos hepatócitos, onde ocorre o metabolismo dos medicamentos.
As substâncias químicas ou os medicamentos podem ser substratos, inibidores ou indutores das enzimas do citocromo P450. Os substratos são as substâncias metabolizadas pela enzima. Os inibidores diminuem a atividade enzimática, impedindo o metabolismo de seus substratos, e aumentando assim a concentração e o efeito do substrato. Os indutores, por outro lado, aumentam a atividade enzimática, acelerando o metabolismo de seus substratos e diminuindo assim a concentração e o efeito do substrato.
As enzimas CYP1A2, CYP3A4, CYP2C9 e CYP2C19 são conhecidas por sofrerem alterações com o uso da maconha.
CYP1A2
Acredita-se que fumar maconha regularmente promova indução da enzima CYP1A2, o que pode diminuir as concentrações séricas dos substratos desta enzima. Um estudo informou que a depuração da teofilina foi 48% maior nas pessoas que fumaram mais de dois baseados por semana.
Acredita-se que a maconha tenha um efeito semelhante em outros substratos da enzima 1A2.
Outros substratos de 1A2: aminofilina, cafeína, clozapina, duloxetina, estradiol, estrogênios, flutamida, fluvoxamina, frovatriptano, lidocaína, melatonina, mexiletina, mirtazapina, olanzapina, propranolol, ramelteon, rasagilina, ropinirol, tizanidina, triamtereno, zolmitriptano.
CYP3A4
A enzima CYP3A4 participa do metabolismo do tetraidrocanabinol e do canabidiol. Portanto, os inibidores da 3A4 podem aumentar as concentrações séricas desses canabinoides, enquanto que os indutores da 3A4 podem diminuir as concentrações séricas deles.
Em um estudo realizado no Reino Unido, a rifampicina (indutora da 3A4) diminuiu em 40% a concentração do tetraidrocanabinol em e em 20% a do canabidiol. No mesmo estudo, o cetoconazol (inibidor da 3A4) aumentou em 20% a concentração do tetraidrocanabinol. Espera-se que outros inibidores e indutores da 3A4 produzam um efeito semelhante.
Fortes indutores da enzima 3A4: carbamazepina, enzalutamida, fosfenitoína, fenobarbital, fenitoína, primidona, rifabutina, rifampina, rifapentina e erva-de-são-joão.
Fortes inibidores da enzima 3A4: claritromicina, darunavir, suco de toranja (grapefruit), itraconazol, cetoconazol, lopinavir, mifepristona, nefazodona, nelfinavir, ombitasvir, paritaprevir, ritonavir, posaconazol, saquinavir, telaprevir, telitromicina, verapamil e voriconazol.
CYP2C9
Além da CYP3A4, a CYP2C9 é a outra enzima conhecida responsável pelo metabolismo do tetraidrocanabinol. Em um estudo realizado com pacientes que apresentavam baixo metabolismo da enzima 2C9, as concentrações de tetraidrocanabinol foram três vezes mais altas do que as dos pacientes com função normal da enzima 2C9.
Embora nenhum estudo conhecido tenha analisado especificamente os efeitos dos inibidores e indutores da enzima 2C9 nas concentrações de tetraidrocanabinol, espera-se que tenham efeitos semelhantes aos dos inibidores e indutores da enzima 3A4.
Fortes indutores da enzima 2C9: barbitúricos, carbamazepina, fenitoína, rifabutina, rifampicina, rifapentina e erva-de-são-joão.
Fortes inibidores da enzima 2C9: amiodarona, cimetidina, clopidogrel, delavirdina, disulfiram, fluconazol, fluorouracil, genfibrozila, metronidazol, fenitoína, sulfadiazina, sulfametoxazol, tolbutamida, ácido valproico e voriconazol.
CYP2C19
Além da enzima 3A4, a enzima 2C19 do citocromo P450 é a outra enzima sabidamente responsável pelo metabolismo do canabidiol. Em um estudo, o omeprazol (inibidor da enzima 2C19) não aumentou as concentrações séricas do canabidiol. Mesmo com esses resultados inesperados, presume-se que os inibidores e indutores da enzima 2C19 promovam efeitos semelhantes nas concentrações de canabidiol aos dos inibidores e indutores da enzima 3A4, até que novos estudos propiciem uma melhor compreensão.
Fortes indutores da enzima 2C19: barbitúricos, carbamazepina, fenitoína, primidona, rifampicina, rifapentina e erva-de-são-joão.
Fortes inibidores da enzima 2C19: cloranfenicol, cimetidina, clopidogrel, delavirdina, efavirenz, esomeprazol, felbamato, fluconazol, fluoxetina, fluvoxamina, isoniazida, modafinil, omeprazol, oxcarbazepina, ticlopidina e voriconazol.
Outras potenciais interações farmacológicas com a maconha
Depressores do sistema nervoso central (SNC). Existem claros indícios de que o tetraidrocanabinol possa aumentar os efeitos sedativos psicomotores e respiratórios, bem como outros efeitos do álcool e de medicamentos depressores do sistema nervoso central.
Anticolinérgicos, cocaína, simpaticomiméticos. Os canabinoides são conhecidos por causar taquicardia. Várias monografias de medicamentos e ensaios clínicos foram publicados indicando que o uso concomitante de maconha e anticolinérgicos, cocaína ou simpaticomiméticos pode aumentar ainda mais os efeitos taquicárdicos e hipertensivos dos canabinoides.
Disulfiram e fluoxetina
Pelo menos dois relatos de casos de pessoas que tomam disulfiram e pelo menos um relato de caso de uma pessoa tomando fluoxetina enquanto também usando maconha indicam uma possível interação promovendo sinais e sintomas de hipomania. As informações da bula da nabilona e do dronabinol também incluem essa interação farmacológica para alertar os médicos sobre este risco potencial.
Varfarina
Um único relato de caso publicado descreve esta interação em um paciente que toma varfarina que também fumava regularmente tabaco e maconha. O paciente apresentava diversas comorbidades, e estava tomando pelo menos outros dez medicamentos. Em pelo menos duas ocasiões o INR (do inglês Internacional Normalized Ratio) aumentou para valores acima de 10, cursando com episódios de sangramento. A única modificação informada em ambas ocasiões foi o aumento de quantidade e frequência do uso da maconha.[24] Os pacientes que tomam varfarina e usam maconha regularmente devem fazer monitoramento rigoroso do INR para averiguar se há alguma interação potencial.
Anticonvulsivantes
Um estudo recente examinou os níveis séricos iniciais dos anticonvulsivantes para identificar as interações medicamentosas entre o canabidiol e 19 anticonvulsivantes durante um estudo aberto de segurança realizado com 81 pacientes (39 adultos e 42 crianças) com epilepsia refratária.
Quando as doses do canabidiol foram aumentadas, os pesquisadores observaram aumento dos níveis séricos de topiramato (P < 0,01), rufinamida (P < 0,01) e desmetilclobazam (P < 0,01), e diminuição dos níveis de clobazam (P < 0,01) entre pacientes adultos e pediátricos. Nos pacientes adultos, observou-se um aumento importante dos níveis séricos de zonisamida (P = 0,02) e eslicarbazepina (P = 0,4) com o aumento da dose de canabidiol.
Não foram observadas outras interações farmacológicos entre os 19 anticonvulsivantes. Os autores recomendaram monitorar os níveis séricos dos anticonvulsivantes nos pacientes que usam canabidiol, uma vez que as interações medicamentosas podem estar correlacionadas a eventos adversos e alterações laboratoriais.
Esteja ciente e oriente os pacientes
Os pacientes que usam maconha devem ser orientados a evitar medicamentos que são metabolizados pelas enzimas do citocromo P450. Quando estes medicamentos não puderem ser evitados, e a previsão seja de que o uso da maconha vá continuar, o paciente deve ser monitorado de perto para possíveis interações farmacológicas.
É provável que fumar mais do que dois baseados por semana aumente o risco de interações relacionadas com os medicamentos. Não existem dados que possibilitem o monitoramento do uso de maconha em larga escala nos Estados Unidos. No entanto, em Washington, estado onde o uso de maconha é legal, estima-se que o usuário médio fume de dois a três baseados por semana.
Com a crescente legalização e uso em todo o país, os profissionais de saúde devem ter maior cautela nos casos de uso concomitante de medicamentos e maconha.
Sarah agradece a colaboração dos alunos de farmácia Nasar Ansari e Tandy Branham nesta pesquisa.
Com informações de Medscape
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