terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

O Futuro dos tratamentos de Saúde

Em uma ponta, as doenças complexas, como câncer e esclerose múltipla, ganham tratamentos inovadores de base biotecnológica.

Na outra, moléstias negligenciadas, como leishmaniose, doença de Chagas e malária, têm a opção de novos tratamentos, promovidos por iniciativas globais de instituições sem fins lucrativos que, graças a formas criativas de atuação, têm conseguido financiar e elevar o número de medicamentos para esses tipos de doenças, muito comuns em países menos desenvolvidos.

O futuro dos tratamentos de saúde passa pela inovação contínua dos grandes laboratórios globais, associado a novas formas de financiamento e compromisso entre ONGs, organismos multilaterais e governos, de forma a produzir medicamentos inovadores a preços acessíveis.

De acordo com a lnterfarma, o setor farmacêutico é o que mais investe em inovação e pesquisa no mundo, em torno de US$ 137 bilhões anuais, o que representa aproximadamente 15,1% das vendas líquidas totais.

Esse número supera significativamente o de outros setores também considerados de alta tecnologia, como os da indústria de softwares (9,5%), hardwares (7,9%), eletrônica (5,1%), automobilística (4,2%) e aeroespacial (4,1%).

"Após um breve soluço, provocado pela crise mundial de 2008-2009, o setor retomou os níveis de investimento anteriores e a tendência é de contínuo crescimento", afirma o diretor da lnterfarma, Marcelo Liebhardt.

A indústria farmacêutica tem investido bastante em doenças complexas, como o câncer e a esclerose múltipla. Segundo Liebhardt, houve recorde no número de aprovações pelo FDA (órgão do governo dos EUA que aprova medicamentos e produtos alimentícios) em 2012, quando 43 novos medicamentos, dos quais dez eram biológicos, foram aprovados, indicando que alguns dos problemas apresentados no pipeline farmacêutico começam a ser superados.

"As aprovações em 2013 indicam um caminho bastante promissor", diz o executivo da lnterfarma.
Com o envelhecimento da população mundial, fenômeno que deverá afetar também de forma significativa a população brasileira nas próximas décadas, aumenta a prevalência de patologias complexas, como o câncer, e também de diabetes e doenças reumáticas.

"Estima-se que, aproximadamente, 20% dos investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) estão direcionados à oncologia", diz.

Biológicos a bola da vez

Um novo tipo de tratamento, cada vez mais individualizado, vem recebendo pesados investimentos da indústria nos últimos anos.

Com menos efeitos colaterais e mais eficiência terapêutica, os medicamentos biológicos - produzidos a partir de organismos vivos e moléculas complexas - ganham espaço nas decisões médicas, sobretudo para tratar doenças complexas, como câncer, artrite reumatoide e fibrose cística. Normalmente eles que os sintéticos e, na maioria das vezes, são necessários dez anos de pesquisas para que um novo produto chegue ao mercado.

Apesar dos custos, o foco da indústria farmacêutica mundial são os medicamentos para tratar das doenças de alta complexidade.

"Um esforço de P&D que envolve anualmente dezenas de bilhões de dólares e está voltado atualmente para o desenvolvimento de medicamentos biotecnológicos, baseados nos novos conhecimentos da engenharia genética", revela o presidente-executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma), Nelson Mussolini. A P&D de medicamentos biológicos está avançando a passos acelerados no mundo graças aos avanços propiciados pelas novas tecnologias, acrescenta Mussolini, que tem uma visão otimista sobre esse tipo de medicamento.

"Espera-se que até 2018 os biológicos representem 50% do faturamento dos cem medicamentos mais vendidos no mundo. Eles deverão atender a um variado número de patologias, inclusive das denominadas doenças órfãs, ainda que a oncologia, diabetes, doenças reumáticas e antivirais continuem liderando o mercado", diz.

Quantia insuficiente

Segundo a lnterfarma, a indústria farmacêutica instalada no Brasil investe em torno de USS 200 milhões por ano em pesquisa e desenvolvimento de medicamentos.

"Os laboratórios farmacêuticos brasileiros nunca investiram tanto em P&D", acrescenta Mussolini.
"Acontece que o montante ainda é modesto se comparado às verbas das grandes farmacêuticas internacionais. Para dar uma noção da disparidade, tome-se como exemplo o ranking das empresas que mais investiram em inovação no mundo em 2012 elaborado pela consultoria Booz & Company. As cinco indústrias farmacêuticas que estão entre as Top 10 - Roche, Novartis, Merck, Pfizer e Johnson & Johnson - investiram USS 43,3 bilhões em P&D naquele ano. Um valor 70% maior do que todo o faturamento do mercado farmacêutico brasileiro no mesmo período, de U$S 25,4 bilhões", completa.

Marcelo Liebhardt concorda que o montante do investimento é muito inferior ao que a indústria poderia e gostaria de investir no Brasil.

Segundo ele, uma proporção significativa do custo de desenvolvimento de medicamentos é representada pelos testes clínicos exigidos pelas autoridades regulatórias que são cada vez mais rigorosos.

Estima-se que os testes de Fase III representam hoje em torno de 40% dos gastos totais em P&D das empresas farmacêuticas de pesquisa.

Em relação à produção de medicamentos biológicos, exceto o tradicional segmento das vacinas, em que os laboratórios oficiais vêm recebendo transferências de tecnologia há algum tempo e também a fabricação de insulina no País, a implantação ainda é bastante incipiente apesar do crescente interesse, avalia o diretor da lnterfarma.

Apesar de o avanço não ser o mesmo do exterior, já é possível encontrar medicamento biológico produzido no Brasil.

E o caso do hormônio do crescimento injetável Omnitrope, primeiro medicamento biológico produzido pela Sandoz brasileira.

Ele é utilizado para o tratamento de crianças e adultos com deficiência do hormônio do crescimento (DGH), síndrome de Turner, insuficiência renal crônica, síndrome de Prader Willi e recém-nascidos pequenos para idade gestacional. Sua substância ativa é a Somatropina.

Incentivo financeiro

O Ministério da Saúde (MS) anuncia que vem desenvolvendo uma política articulada de atração de investimentos, internalização de tecnologia e redução da dependência para o desenvolvimento no País de diversas drogas.

Uma delas em vigor é a da Política de Desenvolvimento Produtivo para a transferência de tecnologia entre instituições públicas e privadas e encomendas tecnológicas para o Sistema Único de Saúde (SUS).

O sucesso dessa política pode ser atestado, segundo o ministério, pela formalização de 88 parcerias voltadas para o desenvolvimento produtivo de insumos, medicamentos, vacinas e produtos para saúde, mobilizando 70 parceiros — 53 laboratórios privados e 17 públicos -para o tratamento de doenças, como o câncer, Aids, doenças mentais, Alzheimer e negligenciadas.

"O acordo entre a Merck Serono e a Bionovis, intermediado pelo Ministério da Saúde, vai permitir a fabricação de produtos de última geração e de alto custo para o tratamento de doenças como câncer e artrite reumatoide, com a participação dos institutos públicos Fiocruz e Instituto Vital Brasil", afirma a assessoria de imprensa do MS.

"Para se ter noção da importância desse programa, até 2012, a economia gerada com as aquisições de dez produtos via PDP foi da ordem de RS 544,4 milhões e incrementou o faturamento dos laboratórios públicos em RS 1,6 bilhão", afirma nota do MS.

Na outra ponta do desenvolvimento de medicamentos estão as doenças negligenciadas, que não receberam esse nome por acaso. Elas afetam mais de 1 bilhão de pessoas e incapacitam ou matam centenas de milhares, representando uma necessidade médica importante que permanece não atendida.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), são enfermidades que prevalecem, principalmente, em países pobres, como a malária, tuberculose, 17 doenças tropicais, 11 doenças diarreicas e 19 outras doenças relacionadas à pobreza, excluindo HIV/Aids.

No mundo todo, as doenças negligenciadas representam uma carga de 11% de todas as doenças. Estudo em conjunto da ONG Medicamentos para Doenças Negligenciadas (Drugs for Neglected Diseases initiative -DNDi), Médicos Sem Fronteiras, OMS e três universidades européias (Oxford, Grenoble e Joseph Fourier) revela que, apesar de progressos, apenas 4% (34) dos 850 novos medicamentos e vacinas aprovados entre 2000 e 2011 foram para doenças negligenciadas, revelando o desequilíbrio entre as necessidades de boa parte da população mundial e a produção industrial.

Segundo o levantamento, a maioria dos produtos terapêuticos desenvolvidos recentemente são versões reformuladas de fármacos já existentes.

Dos 336 novos medicamentos (novas entidades químicas ou NCEs, na sigla em inglês) aprovados para conjunto total das doenças no período de 2000 a 2011, apenas quatro ou 1% do total foram destinados às doenças.

Fonte: Anuário Farmacêutico 2014

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