Lactobacilos
são organismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas,
conferem benefício ao sistema digestivo e imunológico. O problema é que esses
organismos probióticos também são muito sensíveis à própria acidez do estômago.
Cientistas
da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp) têm investigado maneiras de proteger lactobacilos durante a
digestão, permitindo que a utilização de suas propriedades benéficas possa ser
facilitada.
Uma
pesquisa recém-concluída na faculdade indicou que cápsulas de probióticos
recobertas com proteína do soro resistem à passagem pelo sistema digestivo. A
pesquisa investigou a microencapsulação da bactéria Lactobacillus
acidophilus e sua aplicação
na fabricação de alimentos probióticos.
“Realizamos
a pesquisa em duas frentes: explorando características físico-químicas das
microcápsulas e avaliando a aplicação delas na fabricação de iogurte e de
queijo prato”, disse a professora Mirna Lúcia Gigante, coordenadora da pesquisa
que contou com a colaboração de alunos e de Carlos Grosso, também docente na
FEA-Unicamp.
Na
primeira parte do projeto, o grupo avaliou o processo de produção das microcápsulas
com pectina recoberta com proteínas de soro, que ocorre por interação
eletrostática. De acordo com Gigante, a adsorção – processo pelo qual moléculas
são retidas na superfície de sólidos – da proteína na superfície da partícula
foi maior quando a proteína do soro foi tratada termicamente.
Segundo a
pesquisadora, quando expostas experimentalmente ao suco intestinal artificial,
que simula o sistema digestivo na região do intestino humano, as partículas com
proteína de soro se dissolveram mais facilmente do que as partículas só com
pectina.
“Analisamos
a manutenção da viabilidade do probiótico, tanto livre como encapsulado,
durante o processamento do alimento e a conservação deste e sua resistência à
passagem pelo trato gastrointestinal”, disse Gigante.
Isso
porque o microrganismo não deve interferir no processamento nem alterar as
características dos alimentos, ou seja, não pode apresentar quaisquer aspectos que modifiquem os
alimentos. “Ele não pode apresentar textura, odor, sabor ou cor”, disse
Gigante. Além disso, o probiótico tem de sobreviver à elevada acidez da região
gástrica.
No caso
do iogurte, os pesquisadores observaram que a microencapsulação do probiótico
favoreceu a manutenção da sua viabilidade durante 35 dias de armazenamento
refrigerado do produto.
Quando
submetido à passagem pelo suco intestinal, os resultados da capa protetora com
proteína de soro também foram positivos. “Dos probióticos encapsulados, 62%
sobreviveram. Sem a proteção, ou seja, o microrganismo livre, apenas 10%
resistiram”, disse Gigante.
Na
produção do iogurte, quando o Lactobacillus acidophilus foi
microencasulado o produto apresentou menor pós-acidificação em relação ao
probiótico não encapsulado. Isso significa que as características desejáveis do
produto não foram drasticamente alteradas.
Entretanto,
os efeitos da microencapsulação não foram os mesmos no caso do queijo prato. “A
partícula não conferiu efeito protetivo adicional ao probiótico nem durante o
armazenamento do produto nem quando submetido às condições que simulam a
passagem pelo trato gastrointestinal”, disse Gigante.
De acordo
com ela, ao que tudo indica a malha proteica natural do queijo já exerce a
função de proteger e manter vivo o microrganismo.
“Mesmo
assim, os resultados despertaram nosso interesse em aprofundar os estudos dos
efeitos da adição de diferentes probióticos nas características
físico-químicas, microbiológicas e sensoriais do queijo prato”, disse Gigante,
cuja equipe tem analisado a mistura de dois dos probióticos mais utilizados
pela indústria láctea: Lactobacillus acidophilus e Bifidobacterium.
Nova
pesquisa
A
pesquisa teve início em 2008 e contou com a colaboração de pesquisadores
argentinos, como Carla Gerez, do Centro de Referência para Lactobacilos de
Tucumán, na Argentina, que fez parte do seu trabalho de doutorado na
FEA-Unicamp.
“Na época
realizamos nosso primeiro trabalho sobre microencapsulação de probióticos.
Juntamente com o professor Carlos Grosso, especialista em microencapsulação,
utilizamos a técnica da gelificação iônica e coacervação complexa, aplicando
camadas de pectina e proteínas de soro como materiais de proteção”, disse
Gigante.
O estudo
mostrou que, após a exposição à acidez gástrica, a sobrevivência do Lactobacillus
rhamnosus – o probiótico utilizado – foi mais efetiva quando o
organismo estava envolto em micropartículas com capas de proteína de soro do
que livre no sistema digestivo artificial.
“Quando
encapsulado, o microrganismo resiste à passagem pelo trato gastrointestinal e,
finalmente, chega ao intestino, onde ocorrerá sua adsorção. A microcápsula tem
a função de proteger esse microrganismo para que ele tenha uma passagem mais
efetiva pelo sistema digestivo”, disse Gigante.
No
intestino, os benefícios atribuídos aos probióticos podem ser manifestados.
“Existem aqueles que melhoram o trânsito gastrointestinal, outros podem
diminuir infecções, há os que estão relacionados ao controle da pressão
arterial e os que são antialergênicos”, disse.
Gigante
acaba de iniciar nova pesquisa para avaliar a maturação e o
perfil sensorial do queijo prato probiótico tipo lanche adicionado de Lactobacillus
acidophilus e Bifidobacterium.
Por: Flora Serra - Agência FAPESP
