O uso de
antimoniais pentavalentes é considerado caro, tóxico e ineficaz no atual
tratamento da leishmaniose, doença crônica causada por protozoários do gênero Leishmania.
A
leishmaniose é considerada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) uma das
chamadas “doenças negligenciadas”, por atingir populações pobres de países em
desenvolvimento e, por isso mesmo, não receber a devida atenção da indústria
farmacêutica para pesquisa de novos medicamentos.
Um estudo
realizado por pesquisadores do Departamento de Fisiologia do Instituto de
Biociências (IB) da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com cientistas
do Departamento de Microbiologia Molecular da Escola de Medicina da
Universidade de Washington, nos Estados Unidos, pode contribuir para o
desenvolvimento de um novo fármaco que possa impedir que o parasita causador da
doença infecte e se prolifere em humanos.
Os
pesquisadores demonstraram pela primeira vez a importância da localização de
uma enzima dentro do glicossoma – organelas exclusivas da família dos
tripanosomatídeos, a qual as Leishmanias pertencem – do parasita
causador da doença, que pode ser um potencial alvo para impedir o crescimento
do protozoário.
Os
resultados da pesquisa, foram publicados na revista PLoS
One.
Os
resultados também foram apresentados em uma conferência realizada no dia 22 de
julho durante a 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da
Ciência (SBPC), no campus da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), em São
Luís.
Nos
últimos anos, o grupo de pesquisadores da USP tem se dedicado a entender como o
parasita causador da leishmaniose se relaciona com o homem e quais materiais
utiliza para assegurar sua sobrevivência ao infectar um hospedeiro.
Um desses
materiais identificados pelos pesquisadores de diferentes países que estudam a
doença é a arginase – enzima de uma via metabólica das Leishmanias que
é fundamental para o crescimento do parasita e está compartimentada em seu
glicossoma.
Na
pesquisa realizada em parceria com cientistas dos Estados Unidos, foi
demonstrada que a compartimentalização adequada da arginase no glicossoma da Leishmania
amazonensis é importante para a atividade e para possibilitar que o
parasita infecte o hospedeiro.
“Demonstramos
que a localização da arginase é importante dentro da fisiologia celular do
parasita”, disse Lucile Maria Floeter-Winter, professora do IB e coordenadora
do projeto.
Segundo
Floeter-Winter, as constatações feitas no estudo abrem a possibilidade de se
interferir no ciclo da doença, utilizando um novo medicamento que consiga
inibir a enzima do parasita, por exemplo, de modo a interromper a infecção.
“A
descoberta mais importante deste estudo foi identificar a importância da
localização da arginase, que é um alvo importante para impedir que o parasita
cresça em mamíferos”, avaliou Floeter-Winter.
Inibir a
arginase
O
parasita da leishmaniose é transmitido ao homem por insetos vetores conhecidos
como flebotomíneos, como o mosquito-palha, que, ao picar um mamífero para se
alimentar de seu sangue, injeta nele o protozoário na forma promastigota (com
um flagelo longo).
Para
combater o parasita, o organismo humano e de outros mamíferos infectados
recrutam células de defesa do sangue, conhecidas como macrófagos, para
interceptá-los. Porém, o protozoário consegue se multiplicar no interior dos
macrófagos.
Ao
romper, os macrófagos liberam essas células na forma amastigota (sem flagelo),
que migram pelo corpo humano ou do animal à procura de um tecido onde possam se
multiplicar e se estabelecer. E, ao picar um humano ou animal infectado, o
mosquito flebotomíneo se infecta pelo parasita, fechando o ciclo da doença.
Segundo
Floeter-Winter, para que possa ser mais eficaz do que os tratamentos
utilizados, uma nova droga para combater a leishmaniose deverá percorrer todo
essa trajetória de desenvolvimento do parasita e, por conseguinte, da enzima
arginase.
“Como
essa enzima está compartimentalizada dentro do glicossoma, do parasita na forma
amastigota, do fagolissomo (lisossomo que realiza fagocitose) e dentro do
macrófago, uma nova droga ou fármaco para leishmaniose deverá fazer todo esse
percurso para inibir a arginase: atravessar a membrana do macrófago, do
fagossomo, do parasita e do glicossoma. E isso representa um caminho árduo”,
avaliou.
O artigo Leishmania
amazonensis arginase compartmentalization in the glycosome is important for
parasite infectivity (doi: 10.1371), de Floeter-Winter e outros,
publicado na revista PLoS One, pode ser lido em www.plosone.org/article/info%3Adoi%2F10.1371%2Fjournal.pone.0034022.
Por: Elton Alisson, de São Luís (MA) - Agência
FAPESP