terça-feira, 31 de agosto de 2021

Substituto do sal mostra clara redução de AVC, eventos CV e morte

Trocar o sal regular por um substituto do sal com baixo teor de sódio traz grandes benefícios para a saúde pública, como a redução do número de casos de acidente vascular cerebral (AVC), eventos cardiovasculares e morte, revela o novo estudo histórico Salt Substitute and Stroke Study (SSaSS).

O estudo Salt Substitute and Stroke Study foi realizado com 21.000 pessoas com história de acidente vascular cerebral ou hipertensão arterial na China rural, com metade utilizando um substituto de sal com baixo teor de sódio em vez de sal regular.

Os resultados mostraram que, após cinco anos, os que utilizaram o substituto do sal tiveram redução de 14% de casos de AVC, de 13% de eventos cardiovasculares maiores e de 12% de morte. Estes benefícios foram alcançados sem nenhum efeito adverso aparente.

O estudo foi apresentado pelo Dr. Bruce Neal, Ph.D., médico do George Institute for Global Health na Austrália, em 29 de agosto, na edição virtual do congresso de 2021 da European Society of Cardiology (ESC). O estudo foi publicado simultaneamente on-line no periódico New England Journal of Medicine (NEJM).

“Este é um dos maiores ensaios clínicos de intervenção alimentar já realizado e tem mostrado provas muito claras de proteção contra o acidente vascular cerebral, os eventos cardiovasculares e morte prematura, sem efeitos adversos com uma intervenção muito simples e de baixo custo”, concluiu Dr. Bruce.

“Isto é algo muito fácil de trabalhar na alimentação. Você simplesmente substitui o sal regular por um substituto que parece e tem um gosto quase idêntico”, acrescentou.

Ao abordar a questão de saber se esses resultados são generalizáveis para outras populações, Dr. Bruce disse, “Acreditamos que os resultados são relevantes para todos os que comem sal”.

“A maneira como o corpo metaboliza o sódio e o potássio e sua associação com a pressão arterial é praticamente idêntica nas diferentes populações”, disse o pesquisador. “Quase todo mundo, exceto algumas pessoas com doença renal grave, deve evitar o sal ou trocar para um substituto do sal e esperar obter algum benefício com isso”.

Comentaristas da apresentação do ESC elogiaram o estudo como "magnífico", com resultados "extraordinários" e "implicações muito poderosas".

O debatedor da apresentação, o especialista em hipertensão arterial Dr. Bryan Williams, médico do University College London no Reino Unido, declarou que o estudo Salt Substitute e Stroke foi “provavelmente o estudo mais importante que veremos em termos de saúde pública”. O debatedor descreveu as reduções dos casos de acidente vascular cerebral, eventos cardiovasculares e morte como "extraordinárias para uma intervenção tão simples".

O Dr. Bryan acrescentou: “Aqueles que duvidavam dos benefícios da restrição de sal devem agora admitir que estavam errados. O debate termina aqui. Os dados estão na mesa. As intervenções de saúde em nível mundial para implementar estes resultados devem começar agora”.

Ele também ressaltou o grande número de eventos no ensaio clínico. “Este foi um estudo grande, pragmático e de longa duração em uma população de alto risco, e com 5.000 eventos cardiovasculares, isso confere um enorme poder estatístico para demonstrar os benefícios”.

Presidindo a sessão do ESC, a Dr. Barbara Casadei, Ph.D., médica do John Radcliffe Hospital no Reino Unido, disse que o Salt Substitute and Stroke Study “irá mudar a maneira que nós pensamos sobre o sal e ser lembrado pela posteridade”.

Ressaltando que os benefícios foram observados em todos os subgrupos do estudo, o médico Dr. Bertram Pitt, da University of Michigan School of Medicine, Ann Arbor, ficou particularmente entusiasmado com a diminuição dos casos de acidente vascular cerebral observada nos pacientes com diabetes, indicando que vários ensaios clínicos recentes com novos medicamentos para o diabetes não conseguiram demonstrar redução do número de casos de acidente vascular cerebral.

"Para pacientes com diabetes, esta é uma intervenção realmente importante", afirmou o médico.

No entanto, no editorial que acompanha o estudo publicado no NEJM respondeu com um pouco menos de entusiasmo ao estudo do que os comentaristas do ESC.

A Dra. Julie R. Ingelfinger, médica e vice-editora da publicação, indica que o controle seriado dos níveis de potássio não foi feito no ensaio clínico, abrindo a possibilidade de que episódios de hiperpotassemia não tenham sido detectados, e que as pessoas com história de doenças que podem estar associadas a hiperpotassemia não foram estudadas.

A Dr. Julie também observou que, como o substituto do sal foi distribuído para as famílias, teria sido instrutivo ter dados sobre os membros do conjunto familiar sem fatores de risco, mas estes dados não foram obtidos.

“Em geral, o Salt Substitute e Stroke Study traz alguns indícios intrigantes, porém a eficácia mais ampla é difícil de prever, dada a limitação da possibilidade de generalização”, concluiu a médica.

Ensaio clínico randomizado por agrupamentos

O Salt Substitute and Stroke Study foi um ensaio clínico aberto, randomizado em agrupamentos, feito com 20.995 pessoas de 600 aldeias da China rural com história de acidente vascular cerebral ou 60 anos de idade ou mais e hipertensão arterial descompensada. Foram excluídos os pacientes com história de doença renal grave e os que recebiam suplementos de potássio ou diuréticos poupadores de potássio.

Foram randomizados em proporção de 1:1 para o grupo da intervenção, no qual os participantes utilizaram um substituto do sal (cerca de 75% de cloreto de sódio e 25% de cloreto de potássio), ou para o grupo de controle, no qual os participantes continuaram a usar o sal regular (100% cloreto de sódio).

Os resultados mostraram que, após uma média de acompanhamento de 4,74 anos, a pressão arterial sistólica foi reduzida em 3,3 mmHg no grupo do substituto do sal.

A incidência de acidente vascular cerebral, o desfecho primário do estudo, foi de 29,14 eventos por 1000 pessoa-anos no grupo do substituto do sal versus 33,65 eventos por 1.000 pessoa-anos com o sal regular (razão das taxas = 0,86; intervalo de confiança, IC, de 95% de 0,77 a 0,96; P = 0,006).

A incidência de eventos cardiovasculares de monta foi de 49,09 eventos por 1.000 pessoa-anos no grupo do substituto do sal vs. 56,29 eventos por 1.000 pessoa-anos entre os que utilizaram sal regular (razão de taxas = 0,87; IC 95%, de 0,80 a 0,94; P < 0,001).

E a incidência de mortes foi de 39,28 eventos por 1.000 pessoa-anos com o substituto do sal vs. 44,61 eventos por 1.000 pessoa-anos com o sal regular (razão de taxas = 0,88; IC de 95% de 0,82 a 0,95; P < 0,001).

O número de eventos adversos graves atribuídos à hiperpotassemia não foi significativamente maior com o substituto do sal do que com o sal regular (3,35 eventos vs. 3,30 eventos por 1.000 pessoa-anos; razão de taxas = 1,04; IC 95% de 0,80 a 1,37; P = 0,76).

Dr. Bruce informou que 7% a 8% do grupo de controle começaram a usar o substituto do sal durante a vigência do estudo, de modo que estes resultados provavelmente subestimaram o verdadeiro efeito de trocar para um produto substituto do sal.

Lembrando que cerca de 10 milhões de eventos cardiovasculares ocorrem anualmente na China, o pesquisador disse que os resultados do estudo sugeriram que o uso do substituto do sal em vez do sal regular poderia prevenir cerca de 10% desses eventos.

Os fabricantes de alimentos devem fazer mudanças

O Dr. Bruce reconheceu que uma limitação do estudo foi o fato de ter sido realizado em um único país, o que levantaria questões de possibilidade de generalização. Mas ele acredita que os resultados são generalizáveis para outras populações.

Os que mais beneficiariam de trocar para um substituto de sal são aqueles que consomem grandes quantidades de sal à vontade – sal adicionado em casa no momento da cozedura para a preservação de alimentos ou temperos. “Este é o sal que é fácil de substituir com o substituto do sal”, observou o Dr. Bruce.

“Há mais de cinco bilhões de pessoas no mundo que consomem mais de 50% de sua ingestão de sal como sal à vontade – principalmente nos países em desenvolvimento. Estas pessoas poderiam esperar obter benefícios significativos para a saúde com a troca para o substituto do sal”.

O pesquisador indicou que o substituto do sal é de baixo custo e fácil de fabricar. “Os substitutos do sal custam cerca de 50% mais do que o sal regular, mas isso se traduz em apenas um dólar ou dois por pessoa por ano para fazer a troca”.

O Dr. Bruce acredita que estes resultados também se aplicam a países de renda mais alta, mas devem ser implementados pelos governos e fabricantes de alimentos, uma vez que a maior parte do sal nestes países provém de alimentos processados.

“Este estudo fornece fortes evidências para apresentar à indústria alimentar", concluiu o médico. “Gostaríamos que os fabricantes de alimentos trocassem para o substituto do sal e que os produtos com substitutos do sal estivessem amplamente disponíveis nas prateleiras dos supermercados. Exortamos também os governos a tomarem medidas para promover o uso de substitutos do sal em vez do sal regular. Isto poderia ser feito com a tributação do sal regular ou com subsídios para o uso dos substitutos do sal”.

O Salt Substitute and Stroke Study foi financiado por doações do National Health and Medical Research Council of Australia. O Dr. Bruce Neal informa não ter conflitos de interesse. A Dr. Julie R. Ingelfinger é funcionária do New England Journal of Medicine como vice-editora.

European Society of Cardiology (ESC) Congress 2021. Apresentado em 29 de agosto de 2021.

Fonte: Medscape

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