O que é normal e o que é anormal
Quando os limiares de diagnóstico são reduzidos,
ser normal acaba sendo tão inalcançável quanto tentar se parecer com as
supermodelos nas passarelas.
O Dr. Lars Fredrik Svendsen, da Universidade de
Bergen, na Noruega, é mais um que se junta ao enorme grande coro de protestos
contra a ampliação do manual de diagnósticos mentais da Associação Psiquiátrica
Americana (DSM).
As edições do manual de diagnósticos da DSM são
criticadas por baixarem constantemente os limiares de qualificação para um
diagnóstico psiquiátrico.
Essas normas são usadas como referência na maioria
dos outros países.
Quando os psiquiatras redefinem o que é normal e o
que é anormal não se trata de algo restrito aos consultórios.
Segundo o Dr. Svendsen, isso tem significado
cultural muito amplo, já que a redução constante dos limiares de diagnóstico
tem a ver com como os seres humanos se veem.
"Nós estamos no processo de transformar a doença
na norma, onde o normal se torna a exceção. Se isso continuar, vamos finalmente
ver aquilo que consideramos normal colocado no que eu chamo de passarela
mental," diz o pesquisador, referindo-se aos inatingíveis modelos de
beleza divulgados nas passarelas da moda.
Normal como aberração
"Exatamente como as supermodelos nas
passarelas, corremos o risco de ver o normal como uma aberração, tornando-se
algo além do que é humanamente possível," diz o pesquisador.
Na prática, isso pode significar que mais pessoas
se desviem da norma e que mais pessoas vão querer se submeter a tratamentos
médicos simplesmente para se aproximar de alguma aparência de normalidade.
Isso não é muito diferente da maneira como corpos
perfeitos estão sendo manipulados digitalmente por computador nas
revistas de estilo de vida.
"Os manuais de diagnóstico têm um monte de
influência, criando diagnósticos biologicamente determinados," diz
Svendsen. "Esses manuais moldam nossas vidas de uma forma sem
precedentes."
Paradoxalmente, eles são cada vez menos tolerante a
desvios, ao mesmo tempo que muitos mais de nós são considerados
"desviantes" do padrão normal.
"Eu acredito que há uma boa razão para
discutirmos se os critérios que usamos para estabelecer o que é normal e
anormal são razoáveis," observa ele.
Ligeiramente menos anormal
O novo manual, chamado DSM-5, que está previsto
para publicação em 2013, não vai apenas permitir diagnosticar novas doenças,
mas também vai baixar os sintomas que caracterizam o que se chama de
"doenças mentais", criando "sublimites".
Se um paciente atingir os novos critérios
necessários para um diagnóstico, ele não vai necessariamente chegar ao limiar
patológico - em vez disso, ele será considerado apenas um pouco menos anormal.
Uma proposta que está sendo fortemente questionada
é o diagnóstico conhecido como "síndrome do risco de psicose".
A ideia por trás desse diagnóstico é identificar as
pessoas que podem estar desenvolvendo esquizofrenia, para que o paciente possa
receber tratamento em uma idade mais jovem.
Até mesmo Allen Frances, presidente do comitê que
deu origem à força-tarefa que está elaborando o DSM-5, afirmou que isso poderia
facilmente se transformar em uma "mina de ouro para a indústria
farmacêutica, mas a um custo enorme para os novos pacientes falso-positivos,
capturados na rede excessivamente larga do DSM-5".
Luto vira doença
Muitos críticos dos manuais de diagnóstico
acreditam que várias características humanas gerais tornaram-se patologizadas -
um fenômeno conhecido como medicalização - ao longo dos últimos
anos.
Por exemplo, na proposta apresentada pelo DSM-5,
argumenta-se que a dor pós-morte - o luto - se qualifica como um sintoma
incondicional de depressão.
"Tornou-se muito fácil ser diagnosticado com
depressão," argumenta Svendsen. "É preciso lembrar que a depressão é
classificada como uma de nossas doenças mais graves pela Organização Mundial de
Saúde (OMS) e é considerada tão debilitante quanto a cegueira ou a síndrome de
Down."
"Estamos no processo de criar pessoas que são
incapazes de viver a vida," acrescenta ele.
Fonte:
Diário da Saúde - Baseado em artigo de Kim Andreassen