
Até agora, a decisão cabia à família e não ao
paciente, especialmente em casos de impossibilidade de comunicação ou de
demência senil. O doente também poderá designar ao médico um representante para
comunicar a decisão.
Esse procedimento é chamado de "testamento
vital" ou "diretiva antecipada de vontade" e passa a valer com a
publicação, no Diário Oficial, de uma resolução do Conselho Federal de Medicina
(CFM). O texto diz que, para ser válida, basta que a vontade do paciente conste
em seu prontuário médico, sem necessitar de assinatura, registro em cartório ou
testemunhas.
A decisão é facultativa e pode ser revogada a
qualquer momento, mas só a pedido do próprio paciente. Ciente de que dúvidas e
polêmicas virão por aí, o presidente do CFM, Roberto D'Avila, fez questão de
explicar que "em hipótese alguma a vida do paciente será abreviada e a
eutanásia continua proibida".
Ele afirma que o médico continuará obrigado a fazer
tudo o que for possível para curar o doente. A fim de se explicar, ele deu o
exemplo de seu próprio pai, que morreu em 1990.
"Ele tinha um câncer já impossível de ser
curado, estava muito fraco e pediu para que não fosse entubado nem internado na
UTI. Ele escolheu esperar pela morte em casa, cercado pelos filhos e netos, sem
tomar mais a quimioterapia que só lhe causava desconforto e não poderia
curá-lo. Pediu para que, se seu coração parasse, ninguém tentasse reanimá-lo e
o deixássemos partir em paz. Respeitamos a decisão dele."
Outros países já adotam esse tipo de diretiva
antecipada, como EUA, Espanha, Holanda, Argentina e Portugal.
Especialistas em cuidados paliativos consideram a
nova norma uma evolução. Para Pedro Caruso, diretor de UTI do Hospital A.C.
Camargo, o País está em um limbo jurídico no que se refere ao tema. "Não
há um arcabouço legal para a decisão. Embora não exista lei, a situação se
apresenta todos os dias nos hospitais."
Para ele, o fato de o paciente não precisar deixar
por escrito sua posição é positivo. "É uma decisão muito difícil e um
momento delicado. Não precisa burocratizar e impor mais sofrimento."
A médica Ana Paula de Oliveira Ramos, responsável
pelo Setor de Medicina Paliativa da Unifesp, enfatiza a importância de o
assunto ser abordado o quanto antes, o que nem sempre ocorre. "Enquanto o
paciente está bem, é mais fácil falar sobre o assunto. Se está mal e o tema vem
à tona, já surge a associação de que ele está morrendo."
O testamento vital só poderá ser aplicado quando
houver uma doença do tipo crônica degenerativa, como câncer, Alzheimer,
Parkinson ou algo que coloque o paciente em estado vegetativo.
Com a figura do médico de família cada vez mais
rara, para que não se corra o risco de a informação não chegar ao profissional
que comanda o tratamento, a sugestão de D'Avila é que se "comunique a
decisão a todos os médicos pelos quais passar".
E se a família desconhecer a decisão e duvidar da
anotação no prontuário, pensando que se trata de uma medida para reduzir
custos? "Deve prevalecer a relação de confiança entre médico e paciente.
Os procedimentos adotados pelos médicos não são submetidos a nenhum interesse
de operadoras ou hospitais", afirma o presidente do CFM. / colaborou
Mariana Lenharo.
Por: Débora Bergamasco - O Estado de S.Paulo