domingo, 1 de junho de 2014

Estudo sobre picada da jararaca ajuda a entender mecanismos da hemorragia

Há muito se sabe que o envenenamento provocado por serpentes como a jararaca (Bothrops jararaca) pode causar danos aos tecidos ao redor do local da picada e estimular um quadro de hemorragia. Entender as causas desses efeitos, a sua etiologia, no entanto, é um desafio complexo.
É o que conta o médico veterinário Marcelo Larami Santoro, pesquisador do Instituto Butantan, em São Paulo, que conduziu o projeto “Importância da lesão local induzida por metaloproteinases de venenos ofídicos na indução de plaquetopenia em envenenamentos” de 2011 a 2013.

“Na maioria das ocorrências, o soro antiofídico é eficaz para tratar as picadas de jararaca; em casos mais graves, porém, pode ocorrer uma hemorragia muito intensa que deve receber tratamento específico”, disse o pesquisador.

Para entender como o veneno da jararaca afeta o sistema de coagulação e as plaquetas (células que ajudam a controlar a perda de sangue), foram feitos experimentos em ratos utilizando duas vias de inoculação, a subcutânea e a intravenosa. Com isso, procurou-se verificar a importância da lesão local na indução da plaquetopenia (redução da contagem de plaquetas no sangue) e das alterações do sistema de coagulação.

O estudo também testou a importância das duas principais classes de toxinas presentes no veneno, as metaloproteinases e as serinaproteinases; para isso, o veneno da jararaca foi incubado, antes de ser injetado nos animais, com inibidores apropriados. O objetivo da incubação do veneno é promover a inibição de determinadas enzimas. Como já se sabe, ambas as classes apresentam atividade anti-hemostática, ou seja, impedem a detenção da perda sanguínea, reação que ocorre quando o organismo tenta inibir uma hemorragia.

De acordo com os resultados, as duas classes de toxinas não estão diretamente envolvidas na origem da plaquetopenia induzida pelo veneno da jararaca, o que suscitou a conclusão de que outros mecanismos ou toxinas do veneno devam ser responsáveis pela redução das plaquetas. No entanto, as metaloproteinases do veneno se mostram essenciais para o desenvolvimento dos distúrbios da coagulação. Essa evidência contesta uma opinião difundida ao longo dos anos entre médicos e cientistas, de que as serinaproteinases são as toxinas mais importantes para o consumo do fibrinogênio, proteína envolvida no processo de coagulação sanguínea e cuja diminuição no sangue favorece o quadro hemorrágico decorrente da picada da jararaca.

Outro dado importante levantando foi que a lesão provocada no local da inoculação do veneno pode estimular a liberação de fator tissular na circulação sanguínea. Conhecido também como tromboplastina, o fator tissular é uma substância presente em tecidos, monócitos e plaquetas que desempenha um papel fundamental na coagulação sanguínea.

“O aumento do fator tissular na circulação torna a ação do veneno mais potente, aumentando os danos nos tecidos ao favorecer a coagulopatia, que são distúrbios de coagulação”, acrescentou Santoro, ressaltando que o estudo da ação dos venenos ofídicos ao longo do século XX ajudou a ciência a descobrir os mecanismos da coagulação sanguínea.

O artigo Bothrops jararaca venom metalloproteinases are essential for coagulopathy and increase plasma tissue factor levels during envenomation, descrevendo todos esses resultados, será publicado na revista PLOS Neglected Tropical Diseases.

Fonte: Fapesp

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