O câncer de mama é um dos tumores mais
heterogêneos em relação às suas características fisiológica, celular e
molecular. O tumor é constituído pelo componente epitelial maligno e pelo
estroma, que compreende a matriz extracelular e células mesenquimais
adjacentes, incluindo principalmente os fibroblastos, que compõem de 20% a 80%
da massa tumoral.
Evidências na literatura científica
mostram que células estromais associadas ao tumor podem influenciar o
comportamento do câncer, daí a estratégia do grupo de pesquisadores de colocar
o estroma como alvo.
A pesquisa sobre a anatomia molecular
do estroma – associada ao câncer de mama e seus aspectos funcionais e resposta
à droga – é o objetivo de um Projeto Temático.
De acordo com a professora Mitzi
Brentani, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), que
coordena a pesquisa, a importância de colocar o estroma como alvo se deve ao
fato de esse ser um elemento importante não somente no processo de invasão
tumoral, como também para a metástase (formação de uma nova lesão tumoral a
partir de outra).
O Temático, iniciado há três anos,
envolve pesquisadores do Departamento de Radiologia da FMUSP, do Hospital A.C.
Camargo, do Hospital do Câncer de Barretos, do Instituto Brasileiro de Controle
do Câncer e do Hospital Pérola Byington e poderá vir a ter impacto clínico
no tratamento do câncer de mama pela identificação da contribuição dos genes
estromais com sensibilidade a drogas.
Os pesquisadores verificaram
inicialmente que os fibroblastos apresentam perfil gênico diferente dos
fibroblastos encontrados em mama normal, obtidos de pacientes que realizaram a
mamoplastia por motivos estéticos. Também confirmaram que uma das suas
características é a expressão da proteína S100A4 relacionada à metástase.
Em função disso, o grupo estudou
primeiramente a diferença da expressão gênica por sequenciamento entre
fibroblastos – obtidos de diferentes subtipos dos tumores de mama.
Os pesquisadores tentam responder a
uma pergunta fundamental: quais são as mudanças que ocorrem paralelamente
nesses fibroblastos com a perda da sensibilidade hormonal nas células
epiteliais tumorais correspondentes. A pesquisa continua com a determinação dos
microRNAs desses fibroblastos.
“Existem vários trabalhos publicados
sobre a ação antiproliferativa e anti-inflamatória da vitamina D na célula
epitelial do câncer de mama. Por isso, nos interessamos pelo tratamento de
fibroblastos com vitamina D, já que observamos que esses são peças-chave no
desenvolvimento do tumor”, disse Mitzi Brentani. “Verificamos que nos
fibroblastos a vitamina D tem uma ação anti-inflamatória.”
O grupo também averiguou a ação da
rapamicina como inibidor da via pAKT/TOR, via de proliferação muito comum nesse
tipo de tumor.
“Devido à heterogeneidade do tumor,
composto por células epiteliais transformadas e estroma, um dos nossos
objetivos foi verificar se agentes quimioterápicos, cuja finalidade é diminuir
o número de células epiteliais, também poderiam agir sobre o estroma”, disse
Mitzi Brentani.
Terapia neoadjuvante
Em um projeto anterior, o grupo de
pesquisadores identificou padrões de expressão gênica em células epiteliais
tumorais que permitiram classificar tumores de acordo com a resposta à
quimioterapia.
A partir daí, com o objetivo de testar
a hipótese de que quimioterápicos podem agir sobre o estroma, os pesquisadores
realizaram uma terapia neoadjuvante – feita antes da cirurgia com a função de
reduzir a dimensão tumoral e permitir a ressecção dos tumores –, utilizando
quimioterápicos.
Os quimioterápicos empregados foram
doxorubicina, ciclofosfamida e paclitaxel, que são agentes inibidores tumorais
comprovados. O objetivo foi buscar correlacionar a resposta ao tratamento com
as análises do perfil gênico dos fibroblastos.
Mitzi Brentani aponta que esse
subprojeto, que inclui aproximadamente 70 pacientes advindos do Hospital de
Câncer de Barretos, poderá levar à identificação de novos alvos terapêuticos
e contribuir para o estabelecimento de uma quimioterapia personalizada baseada
em fatores preditivos de resposta.
A pesquisadora apresentou o trabalho
no 6º Simpósio de Oncobiologia, realizado pelo Instituto de Bioquímica Médica
da Universidade Federal do Rio de Janeiro no fim de setembro.
Por
Washington Castilhos – Fapesp