Com estudos, indústrias poderão
mudar composição, embalagem e transporte de insumos para evitar toxidade em
produtos.
Um
medicamento, mesmo dentro do prazo de validade, pode formar produtos de
degradação tóxicos para os seres humanos. Na Faculdade de Ciências
Farmacêuticas (FCF) da USP, pesquisadores desenvolvem métodos para identificar
e quantificar os produtos de degradação, assim como os fatores que contribuem
com seu processo de formação. Com esses estudos, as indústrias poderão fazer
modificações na composição, embalagem e transporte dos medicamentos para evitar
o aparecimento de compostos nocivos à saúde.
Os
experimentos utilizaram o antineoplásico Cloridrato de Doxorrubicina, empregado
no tratamento do câncer. "Como o fármaco é injetável, caso haja qualquer
produto de degradação, este estará 100% biodisponível na circulação do
paciente", conta a pesquisadora Mariah Ultramari, que realizou os
testes." O medicamento foi exposto à luz e ao calor, submetido à hidrólise
ácida e básica e a processos de oxidação, para verificar quais os possíveis
produtos que podem se formar durante sua vida útil".
A pesquisa já
identificou quatro possíveis produtos de degradação presentes no medicamento.
"Até o momento foram realizados testes qualitativos, sem medir as
quantidades de cada produto", diz Mariah. "Também é preciso realizar
avaliações específicas de toxicidade". Quanto aos fatores que levam a
degradação, foram identificados preliminarmente a ação da luz, o meio básico
(pH superior a 7) e o oxidativo" .
Uma vez
identificadas as vias da formação dos produtos de degradação, é possível fazer
modificações nos medicamentos. "Um fármaco muito sensível a luz pode ter
sua embalagem trocada por um modelo menos transparente, ou no caso de um
comprimido, por exemplo, pode ter seu revestimento alterado" , diz a
pesquisadora. "Se há problemas de oxidação, um antioxidante pode ser
incluído como excipiente, ou seja, toda substância que faz parte do medicamento
sem ser seu princípio ativo", ressalta o professor Ernani Pinto, da FCF,
que coordena a pesquisa.
Testes
"Todo
medicamento sofre degradação, por isso sempre é estipulado um prazo de validade
pelas indústrias farmacêuticas. Ao longo desse período, alguns fármacos formam
produtos de degradação que podem ser tóxicos e comprometer sua segurança",
aponta o professor. Fatores como transporte e armazenamento podem favorecer a
degradação. "No exterior, há algum tempo, já são exigidos estes testes
para identificar esses produtos. No Brasil, este tema é muito recente e ainda
não foi publicada uma regulamentação específica da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa), que está em fase de elaboração, sem data para
ser divulgada" .
A pesquisa com
o Cloridrato de Doxorrubicina, que faz parte do doutorado de Mariah, irá
detalhar a identificação e quantificação dos produtos de degradação mais
importantes do fármaco. Os estudos de degradação forçada (também chamados de
estudos de estresse) servirão para desenvolver um método indicativo de
estabilidade que servirá especificamente para encontrar produtos de degradação
em medicamentos.
"Atualmente,
todas as indústrias realizam estudos de estabilidade para estipular o prazo de
validade de seus medicamentos", conta a pesquisadora. "O método seria
aplicado em amostras originárias desses estudos, para descobrir se há produtos
de degradação, em que quantidade se encontram e se estão dentro dos limites a
serem estabelecidos pela Anvisa" . Conforme a dosagem, a presença dos
produtos deverá ser notificada (em caso de baixas concentrações), suas
moléculas ativas identificadas (concentrações médias) e a toxicidade
demonstrada (concentrações mais altas dosagens).
De acordo com
o professor da FCF, embora a Anvisa ainda não tenha publicado nenhuma resolução
específica sobre produtos de degradação, ela já exige testes para novos
medicamentos, como forma de preparar as indústrias para a aplicação da norma.
"Este é um grande desafio para os fabricantes nacionais, pois a
identificação exige equipamentos sofisticados, de custo elevado, que só existem
na academia", afirma. "Por isso, as empresas tem procurado as
universidades para desenvolver essa metodologia".
Fonte: USP