Dormir é essencial para o ser humano. Todos aqueles que já experimentaram uma noite mal dormida sabem que a falta de sono adequado leva a diversos incômodos, como irritação, sensação de areia nos olhos, dores de cabeça, cansaço, entre outros. E há pessoas que passam por este problema com frequência, tendo sua qualidade de vida totalmente afetada.
Segundo a neurologista do Instituto do Sono da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Anna Karla Alves Smith, “o sono não é só um desligar”. Enquanto dormimos, nosso corpo continua trabalhando, embora o cérebro e o corpo descansem, há o processamento da memória e de alguns hormônios, como o do crescimento. “É por isso que é tão importante para as crianças dormirem”, disse a médica.
A necessidade de sono também é individualizada e ele passa por estágios, sendo que o sono REM (sigla para Rapid Eye Movement ou movimentos rápidos dos olhos) representa o estágio mais profundo do sono, no qual sonhamos.
Muitas pessoas passam a ter problemas para dormir quando trocam de emprego e precisam trabalhar no período noturno. Anna Karla explicou que isso acontece porque temos ritmos que são aprendidos desde quando somos bebês. “Demora tanto para aprendermos um ritmo biológico, como o sono, por exemplo, que forçar o contrário acaba bagunçando todo o organismo”, disse.
Dalva Poyaris, neurologista do Instituto do Sono, contou que as queixas relacionadas ao sono são muito frequentes e afetam pessoas de ambos os sexos e em idades variadas, sendo que alguns são mais comuns na infância e, outros, até na velhice. “Sabemos que quem dorme menos de cinco horas por noite, vive menos. Daí a importância do sono”, disse. Independentemente de qual seja o problema, há tratamento e não é preciso sofrer ou brigar com a cama. Conheça a seguir alguns dos distúrbios do sono e entenda o problema.
Ronco
Segundo Dalva Poyaris, neurologista do Instituto do Sono, o ronco pode ser classificado como um distúrbio do sono. “Roncar não é normal, a não ser que a pessoa esteja muito cansada ou tenha bebido. Quando o ronco se torna frequente, ele é um distúrbio e quando vem combinado à apneia, se torna sério”, explicou.
O ronco é caracterizado pelo barulho da passagem de ar durante o sono pelas vias aéreas superiores, que ficam parcialmente obstruídas e pode ser indício de algum problema mais grave, como a apneia. Além disso, o ronco pode afetar a qualidade do sono de quem dorme no mesmo quarto que a pessoa que tem esse problema.
Apneia
Bastante frequente, a apneia é caracterizada pela pausa na respiração durante o sono. “Mas é importante salientar que essa pausa é de, no máximo, 20 segundos”, disse Dalva Poyaris, neurologista do Instituto do Sono. Seu principal sintoma é o ronco intenso e frequente, cansaço e sonolência diurnos e inexplicáveis, já que a quantidade de horas dormidas é considerada boa. “É um problema mais frequente em homens, afetando cerca de três homens para cada mulher, e idosos”, disse a neurologista.
Em longo prazo, a apneia pode levar a doenças cardíacas e metabólicas e ao estresse oxidativo, uma vez que o corpo precisa lidar com a constante alteração do nível de oxigênio, levando a um estresse do corpo. O diagnóstico é feito por meio de um exame chamado polisonografia, que gradua a gravidade da apneia e ajuda na determinação do tratamento. Em alguns casos, é preciso que o paciente use um aparelho chamado Cpap, que consiste em uma máscara que joga ar na garganta para que ela se mantenha aberta durante o sono. “É um problema que acontece apenas à noite, mas que traz consequências durante o dia”, contou Dalva.
Sonambulismo
Mais comum em crianças, o sonambulismo, ou parassonia, só precisa de ajuda médica quando causa problemas, pois segundo a neurologista Dalva Poyaris, ele tende a desaparecer com o tempo. Todavia, o mal também pode afetar adultos e seu principal risco é relacionado aos acidentes com escadas, objetos, janelas etc. “É como se houvesse um estímulo para a pessoa levantar, mas ela está dormindo, por isso não lembra de nada. O perigo de acordar um sonâmbulo está em assustá-lo, em ter uma reação abrupta, porque ela acorda confusa. O ideal é levá-la de volta para a cama”, disse a médica do Instituto do Sono.
O sonambulismo não apresenta relação com problemas mentais ou psicológicos, como frisou Dalva, e há tratamentos medicamentosos para tratar o problema, que pode ter ligação genética, já que parentes de sonâmbulos têm dez vezes mais chances de apresentar o mal do que aqueles que não têm ninguém na família com o distúrbio.
Sexomnia
Ainda pouco conhecido, este distúrbio do sono “é um tipo de sonambulismo com comportamento sexual. A pessoa não apenas anda e fala, mas pode mexer em si mesma ou em outra pessoa. Nunca vi na literatura casos de sexomnia em crianças”, disse a neurologista Dalva Poyaris.
O primeiro caso foi relatado em 1996, em um estudo com sete pacientes que gemiam, se masturbavam e até praticavam sexo enquanto dormiam. Anna Karla lembrou que é um problema recente e que muitos parceiros achavam que o comportamento era normal. “Afeta homens e mulheres de diferentes idades, mas não é um distúrbio muito frequente”, contou a neurologista da Unifesp. O tratamento pode envolver terapia e medicamentos.
Transtorno Alimentar Noturno
É um tipo de parassonia no qual a pessoa levanta durante o sono para comer. “Ninguém sabe explicar porque algumas pessoas direcionam a parassonia para o lado sexual e outras, para o alimentar”, disse a neurologista Dalva Poyaris, “mas diferente de um transtorno alimentar como a bulimia, aqui a pessoa não tem consciência do que está fazendo. Ela pode ter fragmentos de memória ou simplesmente não lembrar de nada do que fez enquanto dormia”, contou.
E o interessante é que as pessoas que sofrem deste mal não necessariamente “atacam a geladeira” à procura de alimentos gostosos. “É uma coisa meio atrapalhada. Elas comem o que encontram e, geralmente, fazem combinações esquisitas, como feijão com goiabada”, explicou a neurologista do Instituto do Sono. O tratamento também é feito com medicação associada ou não à terapia.
Pesadelo
Todo mundo, em algum momento da vida, vai experimentar a horrível sensação de ter um pesadelo. Mas, para algumas pessoas, o sonho de caráter ruim e conteúdo apavorante é recorrente e precisa ser investigado. A neurologista Anna Karla Alves Smith contou que há pacientes com apneia, por exemplo, que sonham frequentemente que estão sendo sufocados e o pesadelo acaba sendo um indício que leva à descoberta da doença.
”O paciente procura ajuda médica quando se sente penalizado de alguma forma e quando o problema começa a afetar sua vida quando acordado. Todo distúrbio do sono tem tratamento, basta procurar um médico do sono ou um outro médico que vai indicar o especialista”, explicou a médica. Para pesadelos, terapia e medicamentos podem ser usados no tratamento.
Terror Noturno
O terror noturno é frequente em crianças, com picos aos cinco anos. “Não tem relação com pesadelos e acontece no sono de ondas lentas. É assustador e angustiante e assusta bastante a família. Já vi casos em que os pais foram denunciados por vizinhos e quando a polícia chegou, a criança estava bem, mas sofria de terror noturno. A crise pode durar até cinco minutos e a criança grita como se estivesse sendo atacada”, contou Dalva.
A Anna Karla Smith lembrou que essa parassonia (sonambulismo) tem caráter genético e tende a melhorar com o tempo. O tratamento é à base de medicamentos.
Distúrbio de comportamento do sono REM
Ao contrário do Terror Noturno, este distúrbio afeta idosos, em especial do sexo masculino e o paciente deve ser acompanhado pelo médico. “É um problema bastante interessante porque ele é quase um alerta do corpo. Ao longo de cinco anos, aquele paciente pode vir a desenvolver algum tipo de doença neurológica, como demências e doenças degenerativas. Brincamos que é um distúrbio meio ‘urubu’. O paciente responde bem ao tratamento e alguns acabam desenvolvendo outras doenças”, contou a neurologista Dalva.
Neste distúrbio, a pessoa “vive” o sonho (ou pesadelo), vindo a chutar, gritar, levantar, correr etc e pode se lembrar do ocorrido. Com estes movimentos brutos e repentinos, o paciente pode se lesionar. O tratamento é feito com medicamentos que relaxam durante o sono REM.
Síndrome das Pernas Inquietas
“A pessoa nos procura dizendo que sente uma agonia, uma ‘gastura’ nas pernas e que precisa movê-las para que passe. Só acontece na hora de dormir e há pessoas que acabam levantando, não conseguem pegar no sono, enquanto outras se mexem dormindo e acordam cansadas. Tem gente que procura o médico dizendo que tem vontade de cortar as pernas”, falou Dalva.
Este distúrbio é causado por uma alteração química no cérebro. Existe ligação genética e ele é tratado com remédios e exercícios físicos, que ajudam a melhorar a angústia nas pernas.
Fibromialgia
Embora não seja um distúrbio do sono, a neurologista Dalva Poyaris contou que é uma doença que afeta diretamente a capacidade de dormir. “O sono não é reparador e todo o corpo dói, embora o resultado dos exames não apresente anormalidades”, contou. O problema afeta mais mulheres e o tratamento também inclui medicação.
Narcolepsia
Segundo as neurologistas do Instituto do Sono, este é um transtorno relativamente comum, assim como as queixas de sonolência excessiva. Na narcolepsia é preciso atenção especial com o paciente, que deve evitar dirigir e operar máquinas, pois “a pessoa cai em sono REM, que é o sono profundo, de uma hora para a outra”, contou a médica Dalva Poyaris.
O tratamento requer mudanças no estilo de vida e o uso de remédios estimulantes para manter a pessoa desperta.
Insônia
Segundo a médica Anna Karla Smith, a insônia é um sintoma e não propriamente a doença. “Insônia é a condição de sono de má qualidade ou em quantidade reduzida. É a terceira maior causa de procura por ajuda médica e o tratamento varia de acordo com a determinação do distúrbio. São realizados exames para diagnosticar exatamente qual é o problema que impede que a pessoa durma adequadamente e o tratamento é então escolhido com base no todo”, contou a neurologista do Instituto do Sono.
O problema pode causar alterações de memória, depressão, irritação e, a longo prazo, até alterações cardíacas podem ser associadas ao distúrbio.
Bruxismo
“É uma alteração do sono, de movimento. Não é tão frequente e muitas vezes o paciente não percebe que tem o problema e chega ao consultório por outro sintoma. O dentista é capaz de detectar o problema devido ao desgaste dos dentes”, explicou a neurologia Anna Karla Smith, sobre o problema, que é configurado pela pressão excessiva no maxilar, como se a pessoa trincasse e rangesse os dentes.
O paciente pode apresentar dores de cabeça e na mandíbula e ter seu sono afetado. O tratamento pode ser feito com o auxílio de placas de silicone entre os dentes.
Síndrome da Cabeça Explosiva
Este transtorno acontece no início do sono profundo e a pessoa acorda com um barulho alto e explosivo que apenas ela escutou. O barulho pode parecer com o de uma bomba ou de objetos quebrando e não há uma explicação para sua ocorrência, que não está relacionada à problemas de saúde.
”É um dos distúrbios menos comuns e entra na classe da cefaleia”, disse a médica Anna Karla Smith.
Paralisia do sono
Pode ser associada à narcolepsia e é um fenômeno no qual a mente desperta, mas o corpo não. Anna Karla Smith explicou que quando adormecemos há uma atonia para que os músculos não funcionem e possamos descansar e, quando despertamos, nosso corpo todo acorda conosco. “Nesse distúrbio a pessoa tem a sensação de morte iminente. Quem tem diz que é horrível. Dura apenas alguns segundos e é um descompasso entre corpo e mente”, contou a médica.
O problema pode ser acompanhado ou não de alucinações. Alguns medicamentos podem ser usados para tratar o distúrbio.
Enurese noturna
Embora seja classificada como um distúrbio do sono, a enurese é também um distúrbio de desenvolvimento que afeta mais as crianças. As neurologistas explicaram que o problema deve ser investigado primeiramente pelo pediatra, para descartar causas orgânicas, e só depois, se necessário, é feito o encaminhamento ao médico do sono.
A enurese noturna acontece quando a criança faz xixi na cama e o tratamento pode incluir mudanças no estilo de vida, terapia e até medicamentos.
Fonte: Portal Terra – Saúde