quarta-feira, 2 de abril de 2014

Gerenciamento dos Resíduos de Serviços de Saúde: uma questão ambiental

RESUMO: 

O tema Resíduo de Serviços de Saúde- RSS tem sido objeto de análise de muitos estudos. Os RSS são vistos como problemas que envolvem áreas da saúde pública e saneamento básico. A discussão sobre questões ambientais evoluiu ao passar dos anos, e chegou-se a uma legislação rigorosa sobre o gerenciamento desses resíduos. Contudo não serão normas, leis, resoluções que mudarão como as pessoas veem o potencial de risco dos RSS, e sim o processo de educação ambiental. Os profissionais de saúde que estão envolvidos na geração de resíduos devem ter a consciência dos prejuízos à saúde pública e ao meio ambiente que o mau gerenciamento poderá acarretar. Conscientizar os profissionais envolvidos no gerenciamento dos RSS e que suas ações interferem diretamente no meio ambiente, e que o gerenciamento adequado tem por objetivo preservar a saúde dos profissionais envolvidos, da população e do meio ambiente, para que seja garantida melhor qualidade de vida para toda sociedade.

1. INTRODUÇÃO 

O curso tomado pela vida humana no Planeta Terra é marcado pela produção de resíduos resultantes das suas atividades. Como no início o homem dedicava-se a atividades de caça e coleta e a produção de lixo não apresentava risco e nem preocupação, pois o mesmo era proveniente de material orgânico, e dessa maneira era rapidamente desintegrado pelos microrganismos do solo e logo voltavam a fazer parte do ciclo da vida. (REZENDE, 2006).

Conforme o homem passou a viver em sociedades civilizadas seus hábitos e suas atividades mudaram-se, consequentemente o consumo de produtos e sua produção de resíduos aumentaram, trazendo a dificuldade de como se desfazer desses resíduos que produziam, e a alternativa encontrada foi dispor deles às ruas, em áreas baldias, cursos d’água ou no mar. Resíduo é tudo aquilo que é produzido como resultado não desejado de uma atividade humana, e em geral de qualquer ser vivo. (GUEDES, 2006; REZENDE, 2006).

Contudo foi na sociedade moderna do pós-guerra que foi caracterizada pelo consumo de produtos industrializados e descartáveis que a geração de resíduos passa a ser vista como possível fator de contribuição para os problemas ambientais como relata Rezende (2006).

No tocante a produção de resíduos, Philippi Jr citado por Caldo (2009, p.46) diz que “a produção de resíduos sólidos faz parte do cotidiano do ser humano. Não se pode imaginar um modo de vida que não gere resíduos sólidos”. Todavia o aumento na geração de resíduos é, na realidade, um consumo desnecessário de matéria-prima, que tem como consequência uma velocidade de degradação maior do que a capacidade de regeneração da natureza (SCHNEIDER et al., 2001 apud GUEDES, 2006).

O ser humano produz resíduos poluentes que são encontrados nas formas sólida, líquida e emissões gasosas. Os resíduos sólidos podem provocar alterações intensas não apenas no solo como também na água e no ar atmosférico, se dispostos inadequadamente, eles têm a possibilidade de ocasionarem danos a todas as formas de vida, gerando problemas que podem aparecer anos depois da sua disposição. (MENDES, 2005).

A geração de resíduos e seu posterior abandono no meio ambiente geram sérios problemas ambientais e de saúde pública, problemas que comprometem significativamente a qualidade do ar, da água e da saúde humana. (GUEDES, 2006).

Várias legislações foram elaboradas no decorrer dos anos com o objetivo de buscar soluções e orientações necessárias para que os geradores dos Resíduos de Serviços de Saúde (RSS) pudessem adequar e gerenciar seus resíduos, sem provocar danos ao meio ambiente e à saúde pública, pois estudos apontavam a drástica realidade existente no Brasil, que são os RSS serem dispostos juntamente com resíduos comuns, muitas das vezes sem o tratamento preconizado pela legislação vigente. (GARCIA e RAMOS, 2004).

Vários autores relatam os efeitos maléficos que resíduos sólidos fazem ao meio ambiente e a saúde coletiva, e as principais causas estão relacionadas com deficiência em seu gerenciamento e disposição final.

2. RESÍDUOS SÓLIDOS DE SAÚDE: DEFINIÇÕES, LEGISLAÇÕES E CLASSIFICAÇÕES

“Lixo hospitalar” era a denominação genérica de todos os resíduos nos serviços de saúde no Brasil até o final da década de 1980. Essa terminologia atualmente foi substituída pelo termo “Resíduos de Serviço de Saúde” (RSS). Essa substituição de nomenclaturas ocorreu em função de esses resíduos não serem de origem exclusiva de hospitais. O Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) em sua resolução nº 358 de 29 de abril de 2005 expõe que todos os serviços relacionados com o atendimento à saúde humana e animal incluindo os serviços de assistência domiciliar, funerárias e serviços onde se realizem atividades de embalsamamento, distribuidores de produtos farmacêuticos, farmácias de manipulação, drogarias dentre outros, são geradores de RSS e por isso são responsáveis pelo gerenciamento dos mesmos desde a sua geração até a disposição final, tendo que atender aos requisitos ambientais e de saúde pública e saúde ocupacional. (CONAMA, 2005).

Devido às características peculiares dos RSS, são necessários processos diferenciados em seu gerenciamento. Alguns desses resíduos exigem tratamento prévio para a sua disposição final. (BOTTON, 2011; CONAMA, 2005).

Os resíduos de serviços de saúde são de natureza heterogênea. Portanto, é necessária uma classificação para a segregação desses resíduos. Diferentes classificações foram propostas por várias entidades dentre elas o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). (BOTTON, 2011).

Em abril de 2005, considerando a necessidade de aprimoramento, atualização e complementação dos procedimentos contidos na Resolução CONAMA nº. 283/2001, o CONAMA publicou a Resolução CONAMA nº. 358 de 2005, contudo, visando a necessidade de ação integrada entre os órgãos federais o CONAMA manteve a mesma classificação dos RSS publicada pela RDC nº.306/2004 da ANVISA. (ANVISA, 2004; CONAMA, 2005).

A classificação dos RSS pela resolução nº.358/2005 do CONAMA ficou da seguinte forma:

Grupo A: Potencialmente infectantes. Resíduos com a possível presença de agentes biológicos que devido suas características podem apresentar risco de infecção.

Grupo B: químicos. Resíduos contendo substancias químicas que podem apresentar risco para a saúde pública ou ao meio ambiente, nela estão inclusas drogas, saneantes, resíduos com metais pesados e demais produtos perigosos classificados pela NBR 10.004 da ABNT.

Grupo C: rejeitos radioativos. Qualquer material que contenha radionuclídeos em quantidade superior aos limites de eliminação especificados nas normas da Comissão Nacional de Energia Nuclear-CNEN.

Grupo D: resíduos comuns. Resíduos que não apresentam risco biológico, químico ou radiológico ao meio ambiente ou a saúde, podendo ser comparado aos resíduos domiciliares.

Grupo E: perfurocortante. Materiais perfurocortantes ou escarificantes, tais como agulhas, escalpes, ampolas de vidro, brocas, limas endodônticas, lâminas de bisturi, lancetas, lâminas de barbear e outros similares.

2.1 Gerenciamento dos RSS

O gerenciamento dos RSS é constituído por um conjunto de procedimentos de gestão, com a finalidade de minimizar a produção de resíduos e proporcionar aos resíduos gerados um encaminhamento seguro, de forma eficiente, visando a proteção dos trabalhadores envolvidos, da saúde pública, dos recursos naturais e do meio ambiente. (ANVISA, 2004).

Caberá ao responsável legal dos estabelecimentos geradores de RSS elaborar e implementar um Programa de Gerenciamento de Resíduos de Resíduos de Serviços de Saúde (PGRSS) que envolva todas as etapas de manejo dos RSS, desde sua geração até a disposição final, em conformidade com requisitos legais, sem prejuízo da responsabilidade civil solidária, penal e administrativa, de acordo com a Lei n.º 9.605/1998 que regulamenta os crimes contra o meio ambiente. (ANVISA, 2004; CONAMA, 2005).

Um programa efetivo de gerenciamento de resíduos infectantes é assegurar nível adequado de confiança à saúde pública e ao meio ambiente, em virtude dos riscos apresentados com a presença de agentes infecciosos. Um plano de gerenciamento deve atender a legislação vigente para cada etapa: geração, segregação, acondicionamento, coleta, transporte, armazenamento, tratamento e disposição final com a adoção de práticas para o manejo seguro através de treinamento adequado, uso de equipamentos e EPI’s de acordo com tipo de resíduos gerado, além de prever eventuais ações para prevenir e corrigir situações não ideais em todas as suas fases. (VIEIRA, 2010).

Quando os resíduos não recebem as condições de tratamento adequadas, além de contaminar o lençol freático através do percolato, o ambiente é contaminado com a presença de organismos que podem estar presentes, e em condições favoráveis, como temperatura adequada podem ter a sobrevida mantida em períodos que variam de dias a anos.

Além dos microrganismos apresentados na tabela a E.coli, Pseudomonas aeruginosa e S. aureus são microrganismos de grande importância por estarem geralmente envolvidos na infecção hospitalar e são os mais encontrados em análises microbiológicas dos resíduos de serviços de saúde. (GARCIA e RAMOS, 2004 apud BIDONE, 2001).

É importante salientar ainda que diferentemente dos resíduos domiciliares comuns, os de serviços de saúde podem apresentar grande quantidade de substâncias químicas como desinfetantes, antibióticos e outros medicamentos decorrendo daí também o risco químico além do biológico. (GARCIA e RAMOS, 2004).

Em sua dissertação de mestrado Botton (2011) enfatiza que grande parte dos reagentes químicos presentes na composição de soluções utilizadas nos aparelhos de análise hematológica apresentam toxicidade e risco tanto a saúde de quem os manipula tanto ao meio ambiente.

Ainda no contexto dos resíduos químicos, um estudo realizado por Falqueto (2007) mostra que a disposição inadequada de resíduos de medicamentos podem contaminar a água e o solo, e que substancias quando acumuladas, se tornem tóxicas ao meio ambiente.

A disposição conjunta dos resíduos contendo microrganismos e substâncias químicas podem provocar um aumento das populações bacterianas resistentes a certos antibióticos, detectadas no esgoto de hospitais. Dessa forma, o mau gerenciamento dos resíduos de serviços de saúde pode favorecer a propagação da resistência bacteriana múltipla a antimicrobianos. (GARCIA e RAMOS, 2004).

2.2 Etapas do Gerenciamento dos RSS

Três princípios devem orientar o gerenciamento dos resíduos: reduzir, segregar e reciclar. Esses princípios devem ser incorporados ao PGRSS de todos os estabelecimentos geradores. A primeira providência para um melhor gerenciamento dos resíduos de serviços de saúde é a redução no momento da geração. Evitar o desperdício é uma medida que tem um benefício duplo: economiza recursos não só em relação ao uso de materiais, mas também no tratamento diferenciado desses resíduos. (GARCIA e RAMOS, 2004).

A segregação é o ponto fundamental dos RSS, consiste na separação dos resíduos no momento e local de sua geração, de acordo com características físicas, químicas, biológicas, seu estado físico e os riscos envolvidos. Observa-se dificuldade mesmo dentre os profissionais de saúde de promover a segregação adequada desses resíduos, pois apenas uma parcela é potencialmente infectante. Contudo, se os RSS não forem segregados, todos os resíduos que a ela estiverem misturados também deverão ser tratados como potencialmente infectantes, exigindo procedimentos especiais para acondicionamento, coleta, transporte e disposição final, elevando assim os custos do tratamento desses resíduos. (MENDES, 2005).

Garcia e Ramos (2004) abordam que sendo feita uma segregação adequada, parte dos resíduos de serviços de saúde (por exemplo: embalagens, material de escritório) poderá ser reciclada, trazendo de volta ao ciclo produtivo materiais que seriam descartados, utilizando-os na produção de novos objetos. O processo de reciclagem traz benefícios para a comunidade, pois gera empregos e renda, além de contribuir para a redução da poluição ambiental, pois menos resíduos são depositados em aterros, e ainda implica o menor gasto de recursos naturais.

Depois da segregação adequada, os resíduos de cada categoria deverão ser acondicionados corretamente, em sacos ou recipientes compatíveis com o material a ser armazenado para que evitem vazamentos e que resistam a ações de punctura e ruptura. A NBR 9191/2008 da ABNT estabelece os critérios mínimos para os sacos plásticos de acondicionamento RSS. (ANVISA, 2004; ABNT, 2008).

A identificação correta permite o reconhecimento dos resíduos contidos nos sacos e recipientes, fornecendo assim informação para o correto gerenciamento dos RSS. Deve-se proceder a identificação utilizando-se dos símbolos apresentados pela figura 2, e deve estar aposta nos sacos de acondicionamento, nos recipientes de coleta interna e externa, nos recipientes de transporte interno e externo e nos locais de armazenamento. (ANVISA, 2004).

A próxima etapa do gerenciamento é o transporte interno, que consiste no traslado dos resíduos dos pontos em que foram gerados até o local destinado ao armazenamento temporário ou armazenamento externo. O objetivo do transporte interno é deixar esse RSS que estão acondicionados e identificados em um local seguro para sua posterior coleta para o local de tratamento ou disposição final. O armazenamento temporário, externo, sua coleta e transporte externos obedecem a rigorosos critérios específicos e que devem ser realizados para não comprometer a eficiência do gerenciamento. (CALDO, 2009).

Tratamento dos RSS consiste na aplicação de método, técnica ou processo que modifique as características dos riscos inerentes aos resíduos, reduzindo ou eliminado o risco de contaminação, acidentes ocupacionais ou de dano ao meio ambiente. Já o CONAMA se tratando de conceito de tratamento dos RSS além do conceito proposto pela ANVISA objetiva a preservação da qualidade do meio ambiente. (CONAMA, 2005).

Considera-se como um tratamento adequado para os RSS qualquer processo que, em condições de total segurança e eficiência, modifica as suas características físicas, químicas e biológicas, ajustando-as a padrões aceitos para uma determinada disposição final. Pode ser um processo único ou associado a um determinado tratamento prévio que impeça a disseminação dos agentes patogênicos ou de qualquer outra forma de contaminação acima de limites aceitáveis na regulamentação. (GUEDES, 2006).

Relacionado ao tratamento dos RSS, dados dos IBGE (2010) apresenta que aproximadamente 41,5% dos municípios que coletam RSS não tratam seus resíduos, destacando as macrorregiões Sudeste e Nordeste com o maior número de municípios nesta situação. Analisando o total de municípios por tipo de processamento verifica-se que a maioria deles emprega o incinerador, a autoclave e a queima de resíduos a céu aberto.

Disposição final do RSS é a última fase do gerenciamento que consiste na prática de dispor os resíduos sólidos no solo previamente preparado para recebê-los, de acordo com critérios técnicos de construção e operação. (MENDES, 2005).

Em relação ao destino final dos RSS, dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico do ano de 2008, revelam que nos municípios que coletavam e/ou recebiam tais resíduos, a maior parte deles, 61,1%, informaram dispor os resíduos em vazadouros ou aterros em conjunto com os demais resíduos, enquanto apenas 24,1% das entidades informaram dispor esses resíduos em aterros específicos para resíduos especiais. (IBGE, 2010).


3.0 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A classificação dos resíduos é a etapa mais problemática como aponta Mendes (2005), pois influencia na segregação e altera os procedimentos das outras fases, estando diretamente associados ao fator recursos humanos. Assim, a conscientização dos trabalhadores quanto aos riscos ocupacionais e a importância de seu trabalho para si e para seus semelhantes são alguns dos desafios das autoridades públicas.

A publicação das Resoluções CONAMA n.º 358/2005 e da RDC ANVISA n.º 306/2004 sobre requisitos relativos ao aprimoramento, atualização e complementação dos procedimentos do Gerenciamento dos Resíduos Sólidos de Serviços de Saúde de forma ambientalmente correta, revela uma preocupação das autoridades públicas em decorrência do elevado risco que esses tipos de resíduos oferecem tanto para a saúde do ser humano quanto para o meio ambiente.

Essa preocupação é expressa a nível federal com a publicação da lei federal 12.305/2010 que dentre outras situações prevê a extinção até 2014 de todos os lixões dos 5.565 municípios, e suas respectivas substituições por aterros sanitários. (BRASIL, 2010).

A crescente preocupação com a questão sanitária ambiental em nosso país se deve também aos trabalhos publicados que versam sobre a importância da preservação do meio ambiente e investimento em questões sanitárias, como saneamento básico. Os resíduos dos serviços de saúde estão intimamente ligados a essas questões principalmente devido à inversão proporcional da capacidade contaminante, sendo que pequenas quantidades desses resíduos podem ser capazes de gerar alto dano ambiental.

Como foi apresentado por Garcia e Ramos (2004) o risco sanitário ambiental que envolve o não gerenciamento correto dos RSS está ligado também no aparecimento de bactérias super-resistentes a antibacterianos, que se não for controlada pode desencadear uma crise na saúde pública.

Fonte: Portal Educação

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